Tour du Mont Blanc - Paulo Miranda

TOUR DU MONT-BLANC França-Itália-Suíça setembro.2015

TOUR DU MONT-BLANC França-Itália-Suíça set.2015

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O berço do montanhismo

O ponto culminante dos Alpes(1), sobre o qual passa a fronteira ítalo-francesa, chama-se Monte Branco (em francês, Mont Blanc), uma montanha na forma de domo cujo cume se encontra a 4.808 metros de altitude(2). Até meados do século 18, ainda dentro dos limites do então reino da Sardenha, o teto dos Alpes era vagamente chamado de Montanha Maldita (Montagne Maudite). Na realidade, os quase 400 picos e dezenas de geleiras que formam o atual maciço do Monte Branco eram conhecidos, simplesmente, por "montanhas malditas" e, à exceção de uns poucos habitantes locais - os montagnards - que se aventuravam por suas encostas em busca de cristais e cabritos-montês, praticamente ninguém se interessava por aquele mundo de neve e gelo.

Em 1741, um grupo de ingleses residentes em Genebra realiza uma viagem à região de Chamonix, cidade encravada num vale aos pés das montanhas malditas, durante a qual a segunda maior geleira dos Alpes, que se espalha pelas encostas ao norte do Monte Branco, é batizada de Mer de Glace. Três anos mais tarde, um membro desse grupo - William Windham - publica na Inglaterra um relato da viagem, no que pode ser considerado o primeiro guia turístico de Chamonix. Outro nome importante é Pierre Martel, matemático e oftalmologista de Genebra, responsável pelos primeiros estudos realizados naquela região alpina, entre 1741 e 1742, e a quem se deve o atual nome do ponto culminante dos Alpes.

A partir desse momento, os "homens da planície" começam a ver os Alpes de forma diferente, estimulados, inclusive, por novas ideias divulgadas por pensadores como Jean-Jacques Rousseau, que pregava, dentre outras coisas, o culto à natureza. Mas foi só em 1760 que entra em cena o principal personagem da história do Monte Branco: Horace Bénédict de Saussure (1740-1799). Jovem aristrocrata e cientista de Genebra, Saussure chega à cidade de Chamonix disposto a conhecer de perto as montanhas que formavam o pano de fundo de sua cidade natal. Em meio a inúmeras excursões pela região, alcança o cume do Brévent (2.526 metros), de onde o Monte Branco se revela integralmente, desde a base até o cume. Impressionado, Saussure decide que aquela montanha tinha que ser conquistada e promete um prêmio a quem conseguisse realizar tal feito.

Certamente, essa não foi a primeira vez que alguém se interessou em atingir o cume de uma montanha: corpos congelados de indivíduos pré-colombianos foram encontrados em picos gelados dos Andes; o Monte Fuji, conquistado em 633, é a montanha nevada com a mais antiga "primeira ascenção" confirmada; o espanhol Diego de Ordàs conquistou os 5.465 metros do Popocatéptl (México) em 1520. E de acordo com uma lenda local, um bispo chamado Vallier escalou, no século 15, os 2.838 metros do monte que hoje leva seu nome, nos Pirineus, para exorcizar dragões.

Os Alpes também presenciaram escaladas anteriores à do Monte Branco: em 1ª de setembro de 1358, como gratidão por ter retornado de uma Cruzada à Terra Santa, o nobre italiano Bonifacio Rotario D’Asti escala os 3.538 metros do Rocciamelone (Rochemelon em francês), deixando no cume uma imagem da Virgem Maria. Desde então, o pico que já foi considerado o mais alto da Europa é o destino de uma procissão realizada anualmente no dia 5 de agosto pelos habitantes da região. No entanto, essa escalada, por ter tido uma motivação religiosa, não pode ser considerada um feito alpinístico. Ao contrário da escalada do fácil e modesto Monte Ventoso (1.912 metros), na região francesa da Provença, realizada em 26 de abril de 1336 por Francesco Petrarca (1304-1374). Apesar de existirem dúvidas se o humanista italiano foi a primeira pessoa no topo do ventoso pico, essa escalada reflete uma atitude original: é o primeiro relato conhecido de alguém que pisou no cume de uma montanha pelo simples prazer de estar lá.

Do lançamento do desafio por Saussure até a conquista do Monte Branco, foram necessários 26 anos de muitas explorações e tentativas, durante os quais técnicas e equipamentos tiveram que ser inventados ou readaptados. E como uma consequência natural, foram os montagnards que primeiro responderam ao desafio, tornando-se os precursores dos atuais guias de montanhas. Finalmente, no dia 8 de agosto de 1786, o teto da Europa ocidental é conquistado por dois habitantes da região de Chamonix: o coletor de cristais Jacques Balmat e o médico Michel Paccard.

O feito protagonizado por Saussure, Paccard, Balmat e tantos outros fez surgir o esporte conhecido como montanhismo, isto é, o ato sistemático de escalar montanhas pelo prazer pessoal, utilizando-se de técnicas e equipamentos desenvolvidos quase que exclusivamente para isso. E por ter sido os Alpes o berço desse esporte, o mesmo é mundialmente conhecido, também, como alpinismo(3) - apesar de existirem outros termos com o mesmo significado mas exclusivos de determinadas regiões geográficas, como andinismo (relativo aos Andes) e himalaismo (relativo ao Himalaia).

Conclusão: por ser o berço do montanhismo, o terreno em torno do Monte Branco é considerado solo sagrado pelos amantes das montanhas.

  1. A montanha mais alta da Europa é o Monte Elbrus (5.642 metros), um vulcão localizado nas encostas ocidentais do Cáucaso. Essa cordilheira junto com os Urais, os Mares Egeu, Negro e Cáspio e o Canal de Bósforo formam a arbitrária e controversa linha divisória entre Europa e Ásia.
  2. Medições oficiais desde 2001 têm demostrado uma variação de altitude entre 4.807 e 4.810 metros. Já o cume rochoso, total e permanentemente coberto pela neve, se encontra a 4.792 metros de altitude.
    1. La altitud del Mont-Blanc decrece dos metros
  3. O termo alpinista deve ser usado, exclusivamente, para o escalador de alta montanha, isto é, que envolve rocha, neve e gelo. O praticante de escalada em rocha é conhecido, apenas, como escalador. Assim, todo alpinista é escalador mas nem todo escalador é alpinista.

Fonte:

  • "A History of Mountain Climbing" (Roger Frison-Roche e Sylvain Jouty, Flammarion, 1ª Edição, 1996)
  • "The Alps and Alpinism" (Editado por Karl Lukan, Coward McCann, 1ª Edição estadunidense, 1968)
  • "Tour of Mont Blanc - Complete Two-Way Trekking Guide" (Kev Reynolds, A Cicerone Guide, 2ª Edição, 2007)
  • Wikipedia
  • Google. Pesquisa de imagens